27 de outubro de 2009

O Assédio Moral no Trabalho











Assédio é uma palavra que normalmente se associa a situações de cariz sexual. Porém, essa é uma visão muito restritiva. Na realidade, assédio constitui todo e qualquer comportamento impróprio, inconveniente ou excessivo que, de forma reiterada, comprometa a dignidade ou a integridade física e/ou psíquica de uma pessoa. No contexto do emprego, trata-se da degradação propositada das condições ou do ambiente de trabalho, através de ameaças (mais ou menos implícitas ou explícitas), comportamentos hostis, comunicações não éticas, etcétera, que têm como objectivos a inabilitação, o abatimento moral e a desestabilização emocional do(a) visado(a).



O assédio moral distingue-se de um vulgar conflito laboral pela ausência de igualdade entre as partes. Na realidade, o que existe é uma relação dominador/dominado, em que o “estratega” estabelece as “regras” do “jogo”, minuciosamente delineadas para a submissão do outro até à total perda de identidade. Este, por seu turno, embarca num quadro de miséria física, psicológica e social tão duradoura quanto a astúcia do assediador e a sua própria falta de capacidade para se libertar o permitirem. Por outro lado, a “guerra” não é aberta, “oficial”, o que atira o escondido, o não dito, para um palco de desconfiança, insegurança e medo.



Para se poder considerar uma conduta abusiva como assédio moral é necessário atentar nalguns pontos fundamentais: a veemência da violência psicológica (a gravidade deve ser medida partindo do conceito objectivo de uma pessoa dita normal, porque a vulnerabilidade excessiva a que ficam votadas as pessoas afectadas por alguma patologia é susceptível de as fazer viver com extrema ansiedade situações que, por si, não desencadeariam tal estado de espírito); a continuidade dos episódios no tempo (sendo preciso uma curva temporal suficiente para originar impacto real e ocasionar actos que consubstanciem verdadeira perseguição); a repetitividade da humilhação (passível de interferir na vida do humilhado a ponto de abalar a sua dignidade e as relações afectivas e sociais, cujos possíveis danos na saúde física e mental poderão culminar em improficiência laboral, desemprego e até a morte!); a intencionalidade de provocar sofrimento ao(s) colega(s)/subordinado(s) com a finalidade de o(s) marginalizar; e a transformação dos danos psíquicos em doença, atestada medicamente.



Dentro do assédio moral no trabalho englobam-se atitudes de várias naturezas, levadas a cabo com o invariável intuito de deitar abaixo uma ou várias pessoas. Fazer comentários maldosos em público, inventar ou produzir erros no trabalho alheio, pedir tarefas com uma urgência inexistente, ignorar a presença do trabalhador, impor horários incompatíveis com a vida pessoal do colaborador, isolá-lo do convívio com os colegas ou privá-lo da hora de almoço, não fornecer o material indispensável à realização das funções, não cumprimentar, ordenar trabalhos muito aquém das competências do funcionário, estimular a discriminação entre colegas, não atribuir qualquer tarefa a um empregado, imputar rótulos do género “fraco”, “incompetente”, “incapaz”, demitir sem justa causa (ou levar ao pedido de demissão), controlar as idas ao médico, fazer desaparecer atestados de saúde, multiplicar burocracias, colocar uns colegas a supervisionar outros e espalhar boatos, são exemplos de procedimentos inerentes a um processo de assédio moral no emprego. O stress, não concretizando uma forma de assédio, é, pelo desgaste que gera, um terreno assaz fértil para que se instale o referido processo. As consequências serão tanto mais severas quanto a consciência que se tem do evidente propósito de prejudicar.



Os danos mais frequentes do assediado passam por cansaço exagerado, nervosismo, enxaquecas, distúrbios do sono, irritação permanente, ruminações constantes, perturbações da memória, tremores, hipertensão arterial, tristeza profunda, alteração da personalidade (com nota dominante para uma agressividade crescente), evitação de circunstâncias que tragam associações à tortura psicológica, inversão da escala de valores, pensamentos suicidas ou tentativas de suicídio, desordens do aparelho digestivo, com eventual perda ou ganho consideráveis de peso, hipotético consumo de álcool ou drogas, dores de cabeça, musculares e na coluna, falta de confiança em si, projecção negativista do futuro, agravamento de enfermidades previamente manifestadas, angústia, ansiedade, mágoa, ressentimento, sentimento de fracasso, caos interior, vergonha, culpa, sensação de se ter sido traído(a) e de inutilidade, infelicidade genuína. A estes malefícios podem juntar-se os estragos do desemprego massivo, que incrementa o temor e a sujeição dos trabalhadores, qual vassalagem obrigatória volvidos que estão quase duzentos anos do término da escravatura (legalmente falando, é claro).



O assediador pode actuar isoladamente ou em conjunto com outros comparsas igualmente perversos, dotados de carácter narcisista, que, não suportando a própria dor, a solidão e as contradições que não conseguem admitir em si, assim como a felicidade e o prazer de viver que reconhecem noutros, atacam a auto-estima destes, procurando alcançar o poder ou manter-se nele a qualquer custo, numa busca insaciável de gratificação e de ocultação da incompetência intrínseca.



O assediado, por outro lado, ou seja, a vítima de antemão designada pelo assediador, é activo e competente, responsável, bem-educado, dotado de alguma aptidão acima da média (um negligente, passivo, sem valiosas qualidades profissionais e morais não suscitaria a inveja e o fascínio do assediador nem o faria sentir-se ameaçado), mas também ingénuo, crédulo e com necessidade do amor e da admiração daqueles que o rodeiam, e que receia a desaprovação e tende a culpar-se de tudo. Fragilizado deste modo, o assediado acaba por adoptar posturas induzidas pelo agressor.



O assédio moral é um risco invisível, mas muito concreto, no que concerne às relações e condições de trabalho. Toda a sintomatologia psico-físico-emocional, nomadamente as dificuldades de aprendizagem, de concentração e do sono, a ansiedade, o esquecimento, a irritabilidade, a indecisão e a fadiga podem converter-se em factores favoráveis à ocorrência de acidentes de trabalho, retracção de amizades, casamentos arruinados, aumento das despesas com medicamentos, perda de bens patrimoniais. É um caso muitíssimo sério…



Escrito por: Maria Bijóias Tema: Empresariais/ MMULHER





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